(...) da ashfixia à serotonina

quarta-feira, março 01, 2006

219º

Pé de Dança, O infortúnio

Dança querida, na passadeira de uma língua.
Pede ao manto do músculo que te envolva, que te torne fluente,
que te torne lisa e afiada.
Dança no gume cortante do risco impendente.
Pede à chuva que te lave, que te lamba,
que te torne nova e translúcida.
Pede-lhes mais.
A tua dança é somente conduzida pela viva força do súbito.
Se tremes, tremes, se avanças e cais, ficas caída.
Mas o impulso, o grito, o estalo do tiro salta em ti.
Querida, tu não dás espaço ao medo.
Tu aqueces a fúria das feras, moves tempestades em dias de céu limpo.
Mas dançando, ofereces-me parte do corpo que é sincero.
Bebo-te a verdade crua na pele e sei por fim o limite:
És selvagem. Porém, acabas assim que o vento rompe as traves da carne.
És jovem. Sei que nos escombros da tua louca dança se esconde um fio de pânico mudo.
Descobri-te querida. Não haverá mais brincadeiras de lençol pela manhã.
Uma noite virá pela calada, passo a passo... Pedir-te-ei que dançes.
Nem que seja com os olhos.
Meu amor, assino-te o medo nas órbitas.

1 Comments:

Blogger isabel said...

Escreves tão bem, tens uma sensibilidade fora do comum

O poema é lindo!

Também gostava de saber escrever assim.

Beijinhos

1:37 da tarde  

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