(...) da ashfixia à serotonina

segunda-feira, maio 29, 2006

297º

Erwin Olaf

296º

O teu sadismo monárquico

Emanações controversas assaltam a minha rainha.
Perdoa-lhe, elevado espírito dos bons costumes.
Ela não sabe ainda o que é fazer amor.
Não aprendeu contigo as artes do coito ilegítimo?
Sabes usá-la para te servir como um fino ornamento.
E rasgas com estupro o melhor pano cá do reino...
Que pétalas brilharão pela manhã que vai nascer?
Semeando flores no solo pútrido, colherás apenas rosáceas espinhosas.
O desamor do leito corrupto.
Escolheste o melhor jardim para derramar a seiva envenenada.
Perdoa-lhe agora por falecer tenra, dócil...
Desculpa-lhe se te deve beijos que não sabe dar.
O amor, sua magnificência, não vive nas masmorras.
As artes do teu sadismo crónico são palcos onde cintilam estrelas mudas.
Poderás ter a carne com correntes de ferro e dor.
O amor, esse místico não-ser, não te assistirá pela fúria acesa.
Podes matar cada flor do teu jardim negro...
No subsolo erguer-se-ão as unhas da vingança.
O sémen com que banhaste o teu reino engolir-te-á, definitivo.
Sua alteza, serás o sangue do teu sangue.

domingo, maio 28, 2006

295º

Katarina Sokolova

sábado, maio 27, 2006

294º

Despedida em aberto

O adeus impõe-se.
Acende-se uma vela, um amigo novo.
Mesmo assim, o ruído não nos larga.
Corre para lá da melodia, afasta-se de cada passo dado,
a medo.
Foge-nos como grãos de areia, das dunas.
É impossível recusar a tua presença.
Sinto-te preso nos lábios muito depois.
Muito para além dos dias perseguidos com os impulsos,
as vontades do amor secreto.
O adeus impõe-se, até aqui.
Sustido num sono leve...
A vontade cala-se no peito que arde, a garganta entupida.
Morres-me.
Apagas metade de mim enquanto uma vela se acende.
Um amigo que não vou conhecer.
O adeus fica suspenso para nós,
amantes com medo de ver sóis a raiar, ondas que dançam.
Amantes que não sabem que o são, pois também nunca o foram a sério...
São só amores de lenço na mão.
E, apesar de tudo, o adeus impõe-se.
Com doçura e peças soltas.

293º

Jeffery Scott

sexta-feira, maio 26, 2006

292º

Mais pastilha elástica, lixo bonito

Corrosão esta feita por Ele, às suas medidas.
Cabem dentro de uma chávena.
No pó dos armários, na cozinha gasta com aromas oleosos.
Diz-lhe uma coisa que Ela não saiba e beija-te.
Foi lá fora e viu paixão pintada no céu e no quintal.
Mas lá dentro há pó, mobílias gastas e mais nada.
Houve, talvez antes, calor a transbordar nas paredes.
Pequenas ridicularias com a sua importância.
Olá? Ainda és Esse?
O gajo que dormiu corpo a corpo com quem Ela era?
O que estava Ele a fazer quando decidiu maquilhar-se, sacudir as suas porcarias, ser nova?
Se calhar, muito longe.
Eles foram um casal, de certeza.
Agora são umas quantas fotos sem gosto, expostas em álbuns antiquados.
Sem magia, sem nexo.
Corroem-se lentamente...
A tentar descolar pastilha elástica do tapete do hall.

291º

eolo perfido

290º

Nem sei eu

Quando ficaste para trás.
De frente para um muro, numa rua sem luar.
Quando te perdeste algures, sem saídas no teu carrossel.
Sem música, sem mim.
Nem sei, agora, aonde ficou o teu sorriso.
Onde cabia um gesto de amor nos braços.
Não sei, não lembro, não guardo uma frase da tua boca.
Onde havia lugar para ti... Nem sei eu.
Sei, isso bem sei, uma canção que me fala de um muro,
numa rua apagada.
Sei, isso sei, uma palavra rasgada há muito,
no colo ferido.
Agora a dormir numa canção triste.
Num baloiço da outra margem...
Quando eras uma menina que vivia o dia a seguir.

289º

Elena V

288º

Menina de amanhã

Menina, um dia serás assim, crescida...
Um dia serás mulher.
E, esse dia é amanhã.
Não há regresso quando te vestes para sair.
Não há voz que te chame quando decides brincar lá fora.
O vento é teu amigo e a chuva diverte-te mais.
Não há mãe para ti hoje.
Porque tu queres ser mulher a correr.
E, esse dia é amanhã.

domingo, maio 21, 2006

287º

The party is over

Franck Juery

286º

Não é um pedido

É como se impõe a vaga.
Sem constrangimento, escarpada.
Pega, falsa doçura, nas facas de talhante.
Olha para a Lua e obedece ao passar da nuvem.
Age na sombra, sem nódoas.
Pé leve, olho clínico.
Como as sogras...
Sem pedir, limita-se a dar de beber aos abutres.
Coágulos de chamas mortas.
Como as águas...
É como se impede o coração de soar.
Sufocando os minutos na garganta.
Corrige-se o que a natureza não abortou.
Atempadamente.
Era uma ordem...

285º

Eolo Perfido

284º

Cicatrice

Vestígio de uma fada, entre os dedos dos pés, no nó do corpo.
Resto para ti, quieta, calada e só.
Sobra um cabelo na palma da mão.
Vemos rugas quando chove lá fora e,
ainda assim, há sol a despontar cá dentro.
Vemo-nos nas sombras do leito violado, no som triste do piano de antigamente.
Ainda hoje temos fadas tatuadas nos pés, na raíz que nos imprime sangue.
Há vida.
Muito tempo que resta, que espreita e pede por nós...
Muitas marcas impressas com carícias guardadas no sótão.
E ar puro.
Senta-te e aprende a esperar.
As cicatrizes estão aqui, de oferta.

quinta-feira, maio 18, 2006

283º

Stan Etheridge

282º

Pedidos de mudez

Despedaças, lenta e fria, artérias preciosas, extensões de ti.
Rasgas-me os lábios com beijos, os olhos que não deixas fechar...
Adormecer apenas.
O perdão é evitável se antes passares um só dedo teu neste colo abandonado.
Nunca havia sentido o toque sequer da raiva, o corte das unhas afiadas na pele macia, plena e pura.
Conhecia o sol matinal no rosto desprotegido, a ventania que revolve as folhas no plátano, os risos que tilintam nas ruelas da aldeia.
Não te conhecia de corpo, de nú feito e desfeito apressadamente.
O ódio será um dia ameno?
As palavras apagam-se em mim, num passado pouco presente.
Sou a fuga, o suícidio altruísta.
Será que, sem mim, o sol virá aquecer as vozes dos velhos, apagar as lágrimas dos pequenos?
A pergunta que quero fazer e não posso.
Tu impedes-me de viver mais do que isto.
Dás-me uma chave que não serve e dizes-me que saia...
Que me vá para bem longe...
Vou persistir com a dor de querer mais um pouco teu.
Um gesto repreensivo basta! Atiça-me...
O adeus com beijos magoados. No teu hálito morno,
Eu só fico gelada.

domingo, maio 14, 2006

281º - Desafio















A História perdida no orvalho

À sombra dos dias que se turvam, que se colam ao corpo como a resina nas árvores.
Sob copas rainhas, o vassalo fiel caminha.
Havia um tempo perdido que fora dele e dos seus.
Um tempo de cavalos e de nobres feitos.
Um tempo que se anarquizou, que conduziu os Homens à fome, a Natureza à queda.
Havia meninas nos ramos verdes e flores a enfeitar as vidas conduzidas com leveza.
Houve espaços abertos pelo Sol, caminhos lavados pela chuva.
O brilho emanava da terra fértil...
Depois, muito depois, chegou um predador ao bosque.
Um e outro, muitos mais.
Nasceram animais com sede de odiar.
Brotaram vermes das cascas de árvore, veneno das velhas colmeias.
O mel secou e a seiva que corria na floresta dissipou-se...
Passaram anos, séculos...
Uma noite, ao abrigo da lua de prata, dois pés de porcelana caminharam sobre o manto de ervas espinhosas.
Um rosto mármore foi olhar as árvores e deu-lhes do seu sangue a beber.
Um sangue novo, de tons azul turquesa com luz.
Lentamente, uma manhã acordou no bosque pálido.
Uma flor minúscula ponteou o verde nascente.
E, num banco de madeira tornado leito, coroou-se uma vida de orvalho.
Nasceu um lugar que antes fora perdido.
Um novo espaço para colorir de amor e mel.

sexta-feira, maio 12, 2006

280º

Jarek Kubicki

279º

Agora Bis

É certo e sabido que cai a nódoa...
Impertinente censurar os dedos de fugir.
Arrogante calar pedidos e prazeres certos,
reais como tu.
É teu o lado da lua que escondo sob a pálpebra inchada.
Inconstante a lágrima que treme, que resvala no despropósito.
Aliciante pedaço do antes...
Agora Bis.
É irascível o dedo que apontas...
Agora submergido, alagado no dia-a-dia fácil.
Impubescente paladar.
Se soletrar quase muda, quase de novo...
B-I-S.
Esperar, saber esperar por ti à chuva.
Agora as algemas de antes, a letra que sabemos de cor.
E, demais um impossível Tu.

278º

Michał Karcz

277º

A Febre Magna

Uma questão assola os tristes:
Haverá êxito que ilumine um povo, uma terra?
E depois:
Haverá amor depois da guerra?
As respostas virão fechadas num envelope blindado.
Uma carta de desejos obstruídos...
Virão ventos demolidores ensinar canções aos surdos,
Ciclones que assobiam confidências.
Um campo vasto pode ser semeado de gente que,
por sua vez, semeará mais gente.
Homens colhidos pelas armas.
Outras questões dançam já na ponta da língua...
Se o alvo que recebe o tiro sorri?
Se o sorriso vive no rosto falecido?
E, se o amor cresce num campo regado pelo ódio?
A carta foge-lhes numa rajada, o tempo esvai-se.
A verdade cala-se na areia... Ao doce varrer do mar.
Uma resposta é certa:
O ardor apaga-se na brisa.

quarta-feira, maio 10, 2006

276º

Jeffery Scott

«mistress anaista and the failed attempts at improving on perfection»

275º

Chá das meninas

Som crespo, de rudezas.
Quem ousa calar a voz à madrasta?
Ecos livres são como passos na alvorada insegura.
Adolescência que se mata.
Quem é virgem num quadro de natureza podre?
São velhas as horas que amanhecem num relógio polido...
Demais, cortês.
Para quê?
Ou devo antes saber: Para quem?
Para meninas tolas, corpos imberbes à força crescidos?
E porque não velhas rugas que se tapam no cio?
Se souberes contacta.
Vem antes de corpo e permite (ao menos em Maio),
adolescer para lá dos muros, das lapas.
Uma flor num dia enfermo,
um pedaço de algodão branco.

sábado, maio 06, 2006

274º